Tenho a oportunidade de trabalhar com pessoas autistas há muitos anos, tanto na Tismoo quanto na Revista Autismo. Essa convivência diária me ensinou muito sobre como liderar com mais empatia, objetividade e clareza. Aprendi que, para alguns profissionais autistas, o que parece ser uma instrução simples pode gerar interpretações completamente diferentes — e que isso não tem nada a ver com falta de atenção ou de comprometimento, e sim com uma forma distinta de compreender a linguagem e o contexto.
Certa vez, há alguns anos, pedi a uma pessoa autista da equipe: “Veja as tarefas que precisam ser feitas, pois há algumas que são prioridade e estão atrasadas”. A pessoa não me deu uma resposta naquele dia, eu acabei sobrecarregado com outras demandas que surgiram e voltei ao assunto apenas no dia seguinte, preocupado com a urgência das tarefas e por ainda não ter tido uma resposta.
No dia seguinte, ao retomar o assunto, a resposta foi: “Sim, eu vi”. Ela realmente havia feito o que eu pedira: viu as tarefas. Mas não havia tomado nenhuma ação. Foi quando percebi que o problema não estava na execução, mas na minha comunicação. Eu queria que ela analisasse as tarefas, identificasse as atrasadas, fizesse uma relação e discutíssemos juntos como acelerar as entregas. Mas nada disso foi dito. Na minha cabeça, estava implícito. Na dela, não. Não foi dito!
Comunicação e clareza
Essa experiência me fez repensar profundamente a maneira como eu me comunico. Percebi que dar instruções vagas como “veja isso”, “dá uma olhada” ou “resolve esse ponto” pode gerar mal-entendidos e frustrações. Desde então, passei a adotar uma comunicação mais direta e específica, deixando explícito o que precisa ser feito, o prazo, o resultado esperado e o que deve ser devolvido após a execução. A diferença foi enorme, tanto na compreensão das demandas quanto no clima da equipe.
Para gestores que trabalham com pessoas autistas, minha dica é simples: seja claro, literal e objetivo. Dê orientações completas, explique o propósito da tarefa e, se possível, confirme o entendimento pedindo para a pessoa repetir o que entendeu. Evite figuras de linguagem, ironias e ambiguidades. Essa mudança de postura não apenas ajuda o profissional autista a se sentir mais seguro e produtivo, como também melhora a performance geral da equipe.
Melhoria para todos
Vale destacar que esse tipo de mudança de conduta tem efeito positivo para todos: outros profissionais atípicos que talvez nem saibam que têm alguma neurodivergência passam a se beneficiar de uma comunicação mais estruturada — e até colaboradores neurotípicos ganham com instruções mais claras, reduzindo ruídos e aumentando a precisão nas entregas.
No fim das contas, trabalhar com autistas me ensinou algo que vai muito além da inclusão: a clareza é também uma forma de respeito. Quando um líder se comunica com objetividade, ele elimina o espaço para interpretações equivocadas, reduz ansiedade e promove um ambiente mais justo e produtivo para todos. E essa é, talvez, uma das maiores lições de gestão que o autismo me proporcionou.


